Memória

Heitor Hermenegildo de Aleluia

Heitor Hermenegildo de Aleluia
Heitor Hermenegildo de Aleluia

Seu Heitor era avô da mãe. De tanto a mãe chamá-lo de meu avô, ele também virou nosso avô. “Se trato de compadre aquele que nunca fora, pouca importância deve ser dada. E já boto às claras o assunto. É que o que de menino se ouve, de véio se arrepete. Se era tratado por compadre, pela mãe ou pai, e no calor do aprendizado se ouvia, havera de compadre ser, que nome não se inventa nem se recria, mas se presume.”  (ACHADOS, Seu Zé Esteves, p. 102-103, Mazza Edições). Eu me faceirava dizendo me lembrar do vô Heitor.  Sem o aval da mãe, que dizia eu não ter idade para tal lembrança. Até que resolvi fazer uma descrição direitinha dele: como se vestia, o hábito de sentar de frente pra porta e de pitá.  Quando acreditaram, eu duvidei. Pra firmar juízo, fiz música pra ele (Preto Velho).

Gabriela Pilati cantou… Tá no youtube a prova:

Dona Inês

Dona Inês Pereira de Souza
Dona Inês Pereira de Souza

“Não fosse pelo cabelo crespo e preto, apanhado por uma rede, que contrastam com a pele pálida, aquela figura miúda, tímida e ressabiada, poucas posses de carne, rosto em ângulos arredondados e olhos amiudados, carecendo repuxo, seria facilmente identificada com a sua tribo tapuia”, (ACHADOS, Pérsia, p. 37, Mazza Edições). Esta é a minha mãe, “Dona Inês”. Só não viveu totalmente anônima, por ser de Mangaí-MG, e sua casa ter sido ponto de partida da parentalha. Dali, se embarafustava para uma São Paulo longínqua e profunda, sorvedouro de mão-de-obra e de afetos. Anos 1950 e antes. Lá, se fincaram três irmãos e uma irmã, dois dos quais só a visitaram uma única vez. Festa grande. Despedida.  Por cá, ficaram os pais, duas irmãs, um irmão e parentes. Povoou-se de filhos. Teve quinze vivos. Destes, por herança andarilha, oito se fixaram em BH/Betim. Nasceu em 1922. Casou-se em 1942 com Joaquim Euzébio (1912), cujo apelido usurpou a patente do nome: Geraldo Euzébio. Surpresa para órfãos que nunca haviam corrido os olhos pela certidão de nascimento do pai.

Joaquim Euzébio

Seu Joaquim Euzébio
Seu Joaquim Euzébio

Este é o meu pai. Foto extraída d’outra maior, quando a família éramos seis filhos. Beirava eu, seis anos. Seu Joaquim Euzébio, como era tratado por todos, menos pela certidão de nascimento, que o apelidava de Geraldo. “O miserável não vai morrer sufocado, não? Vamos atolar de novo naquele banco de areia? Pergunta o pensamento. Menino não se atreve em coisas de adulto. Ele dirige sério. Fala nada. De fala, pouco ensina. Faz. Tem prosa pra gente, não. Talvez lhe falte jeito, pelo descostume do outro pai. O dele. Será que isso passa de um para o outro? O silêncio dá respeito e autoridade. Pode até nem ser nada disso. A gente talvez não tivesse nada pra prosear mesmo.” (ACHADOS, Aprendiz, p. 31, Mazza Edições). “Não sabe escrever nem ler, mas não lhe emperram essas facilidades. É grande, forte e tem muito boa cabeça. Até pra fazer contas da aritmética.” (ACHADOS, Pérsia, p. 39, Mazza Edições). Dele nos veio a música, canto e destemor.

Valdir Euzébio Pereira

Valdir Euzébio Pereira
Valdir Euzébio Pereira

Aqui está o Valdir, ostentando mais ou menos 18 anos de idade. Montes Claros, anos 1960. O primogênito. Com ele, formávamos Os Irmãos Euzébio. Oswaldo, fundamental. Alcançava os tenores. Valdir seguia-o. Um pouco abaixo, vinha eu. Ele tinha a manha do falsete. Foi fundamental para a sobrevivência do grupo familiar quando, precocemente, o pai foi se juntar à ordem dos escolhidos. “Canto pra Fingir”, do Renato e Seus Blue Caps; “Mágoa/Alguém na Multidão”, dos Golden Boys, com o coro da rara presença de todos os manos, no início de um Ano Novo em Moc… Quanto empenho no falsete. Quanta alegria, meu Compadre Ilê!

Valmira Euzébio Pereira

Valmira Euzébio Pereira
Valmira Euzébio Pereira

Valmira era de uma inteligência expandida. Quando pirralhinha, a gente se divertia com ela. Dizíamos: Branca, canta tal música. Dávamos o tom no violão e ela cantava.  Depois a gente pedia pra cantar outra. Dávamos o tom errado, de propósito. Impróprio para alcançar a nota do começo.  Terminada a “introdução”, ela ficava calada. A gente insistia, e ela, nada. Quando pode expressar aquela esquisitice, ela dizia: minha voz não dá pra cantar neste tom. Descobri cedo a minha falta de memória para decorar minhas composições. Fazia música e letra, depois, não conseguia me lembrar. Aí, ela entrou. Bastava cantar uma vez pra ela, e pronto! Se eu ouvisse a música de novo, eu a fixava. Esta particularidade criou um laço a mais no relacionamento fraterno. Voz de encantamento, dediquei um conto a ela, no livro ACHADOS. Na adaptação para o teatro, a atriz Mercedes Pilati, o escolheu, dentro outros. “A Cantora” narra o fato real de uma criança de bela voz, que queria cantar e coroar Nossa Senhora e não pode.

Razões do Coração

Razões do Coração
Razões do Coração

Waldemar Euzébio, Esdras (Neném), Milton Ramos, Clóvis Aguiar e Serginho Silva. Agosto de 1997. Betim. Studio Tríade. Saída da Gravação do CD “Razões do Coração” que, por razões que a própria razão reconhece, não foi levado adiante. Restaram 6 faixas de puro talento e minha voz guia emocionada, improvável. Obrigado a todos os músicos. Em especial, Clóvis, pelos arranjos inspirados e ao Luciano, pela competência.